segunda-feira, 4 de maio de 2009

100 m³

Chegue perto, mais perto.
Cheguem mais perto do que quero lhes dizeres, chegue aqui, mas perto do texto que está lendo, mais perto da minha vontade de colocar-lhes próximo o suficiente, para sentir a espessura da forma de uma frase que pesa, sentir o cheiro da fonte, o gosto do tipo, tipografado, tipo engarrafado num litro de vidro, garrafa de cerveja que contém tubaína.
Bem mais perto do que consiga, chegue milímitros de distância, mas o suficiente[mente] para que o foco não se perda, chegue dentro da letra, sente-se na que prefirir. A letra U parece ser tão agradável para um repouso, um cochilo. O b, um banco macio. Escolha a sua, sente-se, deite-se, sinta-se à vontade.
Sou participante, candidato, concorrente, somos só mais um dos padrões de um ser humano. Todos temos dois olhos, duas orelhas, uma boca, um nariz, e ainda assim há quem se faz mais feliz. Éramos tão iguais quando alguém nos pintou, e a obra era tão verdadeira que deixamos de ser pintura, fizemos a mistura, e por mais que fôssemos todos iguais, tornamo-nos tão diferentes. Fenomenologicamente isso é ótimo, então minha fenomenologia da imaginção é ainda melhor.
N`um forte gesto com o pincel de cerdas largas e encharcado de tinta ócre se explode na tela esticada, como uma apunhalada sem que atravesse a corporeidade do campo. E o que vai surgir dessa pintura? Se é que pode se chamar de pintura tentar traduzir visualmente algum sentimento.
Cândido Portinari, fez muito bem na sua tradução do volume para um campo visual, do peso, da força.
Pintar o vento, colorir uma gargalhada, expressar pictóricamente uma súplica, pintar o prazer, pintar a anciedade, a fome, o desgosto, a sensação, que cor tem um sentimento de vitória?
Vou pintar minha janta, mas não pretendo pintar o feijão, o arroz, vou pintar o gosto que vem depois. Vou pintar o peso de uma semente de flor de liz. A satisfação de uma amizade, o grito de uma torcida. A sede saciável. O arder de um prazer.
Chegue perto, bem mais perto.
Vou pintar o seu nariz.